Investigadoras portuguesas da Universidade de Aveiro na fronteira da exploração do mar profundo!
Depois
de Marte, é, provavelmente, o mais enigmático local que a
Humanidade não pisou: o mar profundo. Simbolicamente batizado de
Challenger
150,
em alusão ao ponto mais profundo do planeta (o Challenger Deep), um
novo programa com cientistas de todo o mundo propõe-se trazer à
superfície o conhecimento que ainda se esconde nas profundezas dos
oceanos.
Ao
leme, a bióloga portuguesa Ana Hilário, do Centro de Estudos do
Ambiente e do Mar (CESAM) da Universidade de Aveiro (UA), quer dar um
grande mergulho para a Humanidade e fazer com que o Challenger 150
seja uma referência da Década das Nações Unidas da Ciência do
Oceano para o Desenvolvimento Sustentável.
"O
mar profundo [vastas extensões de água e fundos marinhos entre os
200 e os 11000 metros abaixo da superfície do oceano] é reconhecido
globalmente como uma importante fronteira da ciência e da
descoberta”, aponta a bióloga marinha Ana Hilário, coordenadora
da Challenger 150 a par com Kerry Howell, investigadora na
Universidade de Plymouth (Reino Unido) e especialista em Ecologia do
Mar Profundo.
Apesar
de o mar profundo representar cerca de 60 por cento da superfície da
Terra, aponta a investigadora da UA, “uma grande parte permanece
completamente inexplorada e a Humanidade conhece muito pouco sobre os
seus habitats e como estes contribuem para a saúde de todo o
planeta”.
Para
colmatar esta lacuna, Ana Hilário e Kerry Howell juntaram à sua
volta uma equipa de cientistas de 45 instituições de 17 países que
propõe um programa de investigação, com a duração de 10 anos,
dedicado ao estudo do mar profundo. De Portugal, para além da equipa
da UA, contribuíram para o desenho do programa também cientistas do
CIIMAR (Universidade do Porto), do Okeanos (Universidade dos Açores)
e do CIMA (Universidade do Algarve).
O
Challenger 150 - o ano 2022 marca o 150º aniversário da expedição
do navio HMS Challenger que circum-navegou o globo, mapeando o fundo
do mar, registando a temperatura global do oceano, e proporcionando a
primeira perspetiva da vida no mar profundo - irá coincidir com a
Década das Nações Unidas da Ciência do Oceano para o
Desenvolvimento Sustentável, que decorre de 2021 a 2030.
“Um
dos grandes objetivos do Challenger 150 é a capacitação e aumento
da diversidade no seio da comunidade científica, uma vez que
atualmente a investigação no oceano profundo é conduzida
principalmente por nações desenvolvidas com recursos financeiros
suficientes e acesso a infraestruturas oceanográficas”, explica a
bióloga portuguesa.
Este
programa, esperam os cientistas, irá também gerar mais dados
geológicos, físicos, biogeoquímicos e biológicos através da
inovação e da aplicação de novas tecnologias, e utilizar estes
dados para compreender como as mudanças no mar profundo afetam todo
o meio marinho e a vida no planeta. Este novo conhecimento será
usado para apoiar a tomada de decisões a nível regional, nacional e
internacional sobre questões como a exploração mineira nos fundos
oceânicos, a pesca e a conservação da biodiversidade, bem como a
política climática.
Mais
e melhor colaboração e conhecimento
Mas
o mergulho no mar profundo do Challenger 150 só será possível
através da cooperação internacional. Por isso, os investigadores
do programa publicam hoje um apelo na revista Nature Ecology and
Evolution enquanto, simultaneamente, publicam um esquema detalhado do
Challenger 150 na revista Frontiers in Marine Science.
Liderada
por membros das redes internacionais Deep-Ocean
Stewardship Initiative (DOSI)
e Scientific Committee on Oceanic Research (SCOR), a lista de autores
dos dois artigos inclui cientistas de países desenvolvidos,
emergentes e em desenvolvimento de seis dos sete continentes. Os
cientistas alegam que a Década anunciada pela ONU proporciona uma
oportunidade ímpar de unir a comunidade científica internacional
para dar um salto gigantesco no nosso conhecimento das profundezas do
oceano.
“A
nossa visão é a de que, dentro de 10 anos, qualquer decisão que
possa ter impacto no mar profundo, seja de que forma for, será
tomada com base num conhecimento científico sólido dos oceanos”,
aponta Kerry Howell. Para que isso seja alcançado, sublinha a
investigadora britânica, “é necessário que haja consenso e
colaboração internacional”.
Ana
Hilário antevê que “a Década proporciona a oportunidade de
construir um programa a longo prazo de formação e capacitação de
recursos humanos em ciências do oceano”. Com o Challenger 150,
“pretendemos formar a próxima geração de biólogos do mar
profundo. Vamos concentrar-nos na formação de cientistas de países
em desenvolvimento, mas também de jovens cientistas de todas as
nações, incluindo Portugal”.
Tal
formação, acredita, “irá criar uma rede reforçada que permitirá
aos países exercer plenamente o seu papel nos debates internacionais
sobre a utilização dos recursos marinhos dentro e fora das suas
fronteiras nacionais”.
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